segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

ARREMATE DE 2007 EM BRUXELAS E NO RECIFE

Na última sexta-feira, dia 28, a mídia belga deu ampla divulgação à notícia fornecida pelo Departamento de Combate ao Terrorismo da Polícia Federal da Bélgica referente à existência de fortes indícios de que atos de caráter terrorista poderiam (ou poderão) ocorrer nos próximos dias, principalmente na cidade de Bruxelas. A informação decorre da dissolução de um grupo de cerca de 15 extremistas islâmicos preparados para tentar o resgate de Nizar Trabelisi, conhecido terrorista islâmico preso há alguns anos. Armas e explosivos em quantidade capaz de provocar graves atentados foram localizados e a polícia não sabe se outras células ainda existem. Bruxelas está em alerta máximo, com especial atenção para as estações do metrô, os bazares de natal e a Grand Place, bem assim, para o aeroporto internacional de Bruxelas-Zaventem.

No dia 31 de dezembro de 2007, todos os bazares de natal e a pista de patinação no gelo irão encerrar as atividades às 18:00h e 20:00h, respectivamente. A grande exibição de fogos de artifício em comemoração à noite de São Silvestre, no Mont des Arts, em Bruxelas, foi suspensa por razões de segurança.

Para aqueles que julgam que Bruxelas, onde eu já morei, está muito longe do Recife, onde estou neste momento, reproduzo a seguir notícia da primeira página de um dos periódicos pernambucanos:

Bandidos matam três PMs no fim de semana. Os crimes ocorreram em 24 horas. Policial foi executado em Jardim Paulista, no Grande Recife. Em Escada, PM foi morto enquanto dormia num ônibus, durante assalto. Em Vitória, um soldado reformado também foi assassinado”. Não só em Bruxelas, mas também no Recife, o terrorismo lança os seus tentáculos, sejam eles de caráter político, sejam de ordem social.

Com estas notícias encerro as minhas postagens de 2007. Eis a realidade em que vivemos, eis a imagem que temos a deixar para as gerações futuras.

Pergunto, então, "É assim que pretendemos marcar a nossa época?” Quando será que o terror vai dar lugar à tão esperada Era de Aquário? Quando os homens irão descobrir que a solução está na convivência pacífica e não na destruição mútua? É com tristeza que tenho de responder “Provavelmente, nunca”. Não quero, porém, deixar que a descrença no homem domine o meu pensamento, pois ainda acho possível que a luz do YANG supere as sombras do YIN, ambos existentes no Ser Humano.

Paz, mais paz, sempre paz é com ela que o Lugar do Souto gostaria que 2008 presenteasse a todos os povos em todos os lugares.

terça-feira, 25 de dezembro de 2007

FELIZ NATAL

Que o espírito da celebração dos primeiros cristãos possa voltar aos nossos corações e mentes. Que o Natal seja lembrado como o natalício Daquele que modificou a história de grande parte da humanidade e que foi enviado pelo Pai Criador para ser mais um processo na evolução da criação.
Festas, prendas ou presentes sim, mas sem esquecer a Mensagem de Paz e Amor trazida por Jesus, o Nazareno.

Feliz Natal para quem me lê!

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

OS PREGÕES DO RECIFE

Em uma manhã chuvosa do início desta semana, enquanto eu fazia a barba e escutava música no mini-rádio de pilhas, uma emissora transmitiu o velho fado “Lisboa Antiga”, cantado por Francisco José.

"Lisboa Antiga", fado, Francisco José! A que período pertence tudo isso? Ao Jurássico, devem pensar os mais jovens. E têm razão, visto que a música e o intérprete são de uma época distante e desconhecida para a juventude eletrônica dos tempos atuais. Quanto ao fado, ele continua bem, obrigado!

Não é sobre o Jurássico e seus dinossauros que quero escrever, nem sobreLisboa - a antiga e a atual - e, muito menos, sobre fados ou fados canções. Qual é, portanto, a conexão entre o rádio tocar um velho fado canção à hora em que me barbeava e o título desta postagem?

Quem conhece "Lisboa Antiga" (a música) sabe que o último verso faz referência aos “pregões matinais que já não voltam mais” e aí está a resposta. Essa citação avivou a memória e me fez lembrar dos pregões de um Recife muito distante no tempo - mas não tanto no espaço - e que também não voltam mais. Lembrei tanto que, por um triz, não me cortei! Decidi, então, escrever este texto.

As pessoas que julgam que só na antiga Lisboa é que havia "pregões matinais que já não voltam mais", estão muito enganadas, pois o Recife também os tinha, não apenas matinais, mas vespertinos e noturnos. Os ambulantes de minha rua (quem tem lido este arremedo de diário sabe qual rua é a que chamo de minha) começavam cedo o apregoado. Hoje, com o distanciamento temporal, posso avaliar em sua plenitude o prazer que me dava, durante as férias escolares, ficar todas as manhãs em casa com vários gibis para ler, dois pães com manteiga-e-açúcar para comer e os pregões lá fora para ouvir.

O primeiro a passar na rua era o homem do peixe, que apregoava “Olha o peixe fresco! Quem vai querer?”. As regras do bem escrever no vernáculo proíbem que reproduza aqui o som que eu ouvia. Que me perdoem os mestres, mas o som que os meus ouvidos de criança captavam era exatamente este: “Óia o pêxe frêxco! Quem vai querêê?”, com muitos “xises” e sem nenhum “erre” final pronunciado, como é característico do falar popular do Recife. Seu Pedro era o “homem do peixe” e durante anos habituei-me a vê-lo adentrando o portão com o melhor pescado que havia saído naquela madrugada das jangadas da "Balança de Olinda." Quantos seriam os quilômetros diários que aquele homem andaria equilibrando, ora aos ombros, ora à cabeça - conforme a quantidade -, o balaio ou os balaios repletos dos peixes e crustáceos que apregoava com um pregão melodioso entoado pela voz de caboclo?

Mais tarde, chegava o homem da verdura e da fruta e o pregão – ainda que no mesmo ritmo daquele do vendedor de “Peixe fresco” - mudava para - “Verdureiro! Maxixe e quiabo fresquinhos, diretos da granja. Olha a laranja lima. Tem laranja da Bahia”. Nem sempre a "Maria lá de casa" comprava verdura ou fruta ao verdureiro ambulante, pois achava que na feira do Parque Amorim (aquele parque do primitivo peixe-boi e do famoso papa-figo) elas eram mais baratas e mais frescas do que as oferecidas na nossa porta. Algumas vezes, o pregão era substituído por - “Macaxeira branca, da boa. Quem vai querer?”, ou então pelo clássico - “Óia” o inhame, que ele hoje tá bom". A mudança na oferta era feita de acordo com o que ele mais precisava vender naquele dia.

No início da tarde, passava o emblemático mascate, com um pregão mais simples, mas não menos melodioso - “Mascaaaate”, apregoado ao mesmo tempo em que, com uma das mãos, percutia a matraca que improvisara e, com a outra, conduzia a obediente mula. O estoque era de fazer inveja a muitos armarinhos famosos e tinha desde inúmeros botões, de todos os tamanhos e cores, a alfinetes, ilhoses, linhas e muito mais. Cada gaveta da carroça que ele abria era um mundo desconhecido, no qual eu entrava e deixava voar a imaginação.

Ao fim do dia, depois do banho, era a vez do menino do cavaquinho - “Cavaquinho docinho, três por quinhentos réis! Quem quer? Tá acabando”. Em seguida, o homem do algodão doce e depois o da cocada. À noitinha, sem falta, vinha o homem do cuscuz. De longe, ouvia-se a voz de barítono que entoava o pregão - “Cuscuz quentinho, hoje está bom”, complementado pelo silvo de um apito exclusivo. - “Maria, fique de olho no homem do cuscuz, porque eu vou querer dois para a ceia”, dizia mamãe. E lá ia a pobre Maria para o muro atocaiar o homem e escolher os cuscuzes.

À noite, depois da ceia, os adultos colocavam as cadeiras na calçada para jogar prosa fora e a criançada brincava de dono de calçada, de lacochia (“corre, corre lacochia, tá de noite, tá de dia ...”) ou de garrafão, até que, lá pelas oito e meia, ouvia-se no começo da rua o pregão favorito de todos - “Sorvete, olha o sorvete, tem de cajá, mangaba e goiaba” - Que delícia! Ainda vislumbro a postura elegante daquele neto de Angola ou do Congo, que trazia à cabeça uma enorme lata sobre rodilha de trapos, e o alvoroço que tomava conta de cada um de nós. Além da lata com o sorvete, que antes fora lata de manteiga, trazia outra, em forma cilíndrica, com os casquinhos de servir o sorvete -. “Óia u sôvete! Tem de sapoti, cajarana e ingá”, naquela época, era assim que me soava o pregão e é assim que, neste exato momento, ele ainda me soa. Quantos sabores deliciosos e quantas crises de garganta sofridas, por tomar sorvete quando estava suado das brincadeiras!

Será que ainda há pregões em alguma cidade? Haverá pregões à antiga, com aquela música de ritmo leve e morno, misto de récita e de canto, haverá? Talvez sim, na Pasárgada de Manuel Bandeira ou na Utopia de Morus, ambas cidades irreais, ambas, quiméricas.

sábado, 15 de dezembro de 2007

MISS BELGIQUE 2008

Podem ficar descansados que, apesar do título, não vou escrever uma grande crônica a respeito de misses. Assim também seria demais!Depois de ter descrito, há apenas três dias, o meu primeiro encontro com misses - ainda que eu não lembre desse ocorrido -, os leitores podem pensar que domino o assunto, que o aprecio ou que a ele dedico parte do meu tempo de lazer. Não, este não é o meu tema favorito, confesso, mas não tenho nada contra quem estuda a matéria, analisa os resultados dos concursos ou faz prognósticos sobre os próximos.
Ontem, ao ler as notícias recentes sobre Bruxelas e a Bélgica em geral, chamou-me a atenção uma matéria a respeito das candidatas ao título de Miss Bélgica 2008, pois tenho um amigo que já morou na Bélgica, creio eu que em Antuérpia e em Bruxelas, e que sempre acompanhava os concursos nas décadas de 1960 e 1970, os de lá e os do Brasil.
Decidi, a título de informação para esse amigo anônimo, ilustrar esta postagem com fotos de cinco semi-finalistas do concurso lá da Bélgica, e ele, que conheceu tanta gente nas cidades onde morou, talvez reconheça alguma que seja filha de uma amiga ou de um amigo do passado.
Na Bélgica, tudo é bizarro - até concursos de misses - e uma cidade pode ter várias representantes no concurso nacional, daí a razão de as duas primeiras beldades serem representantes de Bruxelas Capital.

Miss Bruxelles






Miss Bruxelles »»»











« « « Miss Antwerpen








Miss Liège »»»»»




















Melhor terminar por aqui, para cumprir a promessa que fiz no início de não escrever demais. Aproveito para prometer, também, que nunca mais falarei de misses neste Blog, sejam elas de que países forem.




Ah sim! Faltou a foto da quinta semifinalista: Miss Limbourg






Antes que alguém menos avisado, ou mais distraído, ou que não conheça a Bélgica de hoje - ou sei lá por qual razão - faça a pergunta, confirmo que as fotos são de candidatas de nacionalidade belga ao concurso de Miss Bélgica 2008. Não me enganei de país, não senhor!

OSCAR NIEMEYER - UM SÉCULO DE VIDA, UMA ARTE PARA MUITOS SÉCULOS

100 anos é muita coisa, pelo menos para nós humanos mortais.

Recebi da vida o presente de ter celebrado os 100 anos de minha avó materna - a única que eu conheci -, estando ela em plena atividade física, ainda que deliciosamente esquecida do que não lhe interessava recordar. Aquele dia 12 de março de 1987 faz parte das “gracias a la vida” que tenho a dar. Um ano depois do centenário, eu estava de novo ao seu lado para celebrar os 101 anos, pois Vovó só resolveu nos deixar aos cento e um anos e sete meses, provavelmente por não ter mais interesse com o que se passava neste mundo e ter a certeza de que o lado de lá seria bem mais interessante. A saudade ainda hoje é grande, mas sou feliz porque a tive ao meu lado por tantos anos de minha vida.



No Brasil - e um pouco por toda a parte - celebra-se hoje o centenário de um dos ícones dos tempos atuais, o arquiteto Oscar Niemeyer, carioca, brasileiro, cidadão do mundo. Nada mais lugar comum do que escolher o dia de hoje para falar de Niemeyer, afinal a mídia já disse tudo o que tinha (e o que tem) para ser dito sobre o arquiteto de Brasília. Para que falar mais? O homem está aí, vivo e ativo, com cem anos. A obra está em toda a parte onde ele a plantou e a arte é aberta à visitação pública, com o detalhe importante de que não é preciso pagar para apreciar.

De tudo o que já li e ouvi sobre a personalidade de Oscar Niemeyer, imagino que ele esteja incomodado com as homenagens pelo cente
nário, embora, lá no seu interior mais profundo, deva estar feliz. Afinal, completar 100 anos em plena atividade intelectual é motivo de muita felicidade e o assédio que o incomoda é o preço que uma pessoa tem de pagar pelo sucesso, por ser bom no que faz, por ser ímpar na arte que produz.





Não sou arquiteto nem nunca tive a menor intenção de o ser, mas sou um esteta e, nessa condição, sou apaixonado por cada uma das obras de Oscar Niemeyer, as que conheço e as que só vi por foto ou em filme. Por tudo já ter sido dito sobre o arquiteto e por não saber falar do homem, da obra, das linhas arquitetônicas, optei por fazer desta postagem uma grande colagem dos monumentos com que ele decorou Brasília, cidade que escolhi para morar. Não me perguntem se gosto de Brasília, porque não saberia responder, mas garanto que se gostar do que Niemeyer produziu – e ainda produz - é gostar de Brasília, então, eu gosto muito de Brasília. Gosto das formas dos seus prédios e monumentos, das curvas sedutoras, da força do concreto, enfim, da harmonia do conjunto. Nada na obra de Oscar Niemeyer me desagrada, posso então concluir que nada na arquitetura de Brasília me desagrada. Ainda que seja com Brasília que homenageio o arquiteto criador, não resisti em postar as duas fotos abaixo do Museu Niemeyer, em Curitiba, captadas por mim, em uma manhã chuvosa do mês de novembro passado.
Obrigado Niemeyer! Feliz centenário!

























quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

A QUE HORAS É QUE VAMOS LANCHAR ?

No Recife, em tempos remotos, as casas comerciais que atualmente (e há já bastante tempo, aliás) são conhecidas como "lanchonetes", eram chamadas de casas de chá, casas de lanche ou, simplesmente, pastelarias, neste último caso, só quando fabricavam os produtos que vendiam.

Na infância, nada me dava maior prazer do que ir ao centro do Recife com mamãe, minha irmã e, quando ainda era criança pequena, com a babá que nos acompanhava para me levar ao colo. Uma manhã, em que minha irmã não foi conosco, uma “tragédia” aconteceu. Por alguma razão que desconheço, não fomos no carro do meu pai, mas sim, de ônibus. Lembro de que naquele tempo os ônibus circulavam pela rua Nova no sentido subúrbio-centro e, em dada altura, já na rua Nova, a babá foi empurrada e saiu do ônibus, me arrastando com ela, enquanto que a mamãe continuou lá dentro, creio eu que até à pracinha do Diário.



A partir daí, a imagem que até hoje guardo é a do desespero da babá - que chorava mais do que eu, sem saber nem onde estava nem para onde deveria ir. Havia muita gente estranha à nossa volta e empurra-empurra para ver o que se passava. Naquele momento, eu devo ter tomado consciência de que estava perdido, pois ainda recordo a terrível sensação de perda daquilo que, até então, eu julgava impossível perder, a segurança. Devem ter sido minutos tão assustadores para mim que consigo hoje visualizar tudo, embora tivesse dois ou três anos de idade. Sem dúvida que esse fato aconteceu no ano de 1950, porque conta a tradição oral que a bela goiana Jussara Marques, Miss Brasil 1949, estava em visita ao Recife naquele exato dia e que, em companhia da Miss Pernambuco, também de 1949, Maria Auxiliadora Manguinho, visitava uma loja, na rua Nova, representante dos produtos de Helen Rubinstein, daí haver tanta gente na cidade àquela hora da manhã.

Algumas almas caridosas levaram-nos para a loja Quatro e Duzentos, na esquina da matriz de Santo Antônio. É isso mesmo, loja 4.200 e não 4.400, cujo prédio desabou anos mais tarde e se situava a meio da rua e não em uma esquina, como a que nos acolheu. Reza a lenda que foram as Misses Brasil e Pernambuco as “almas caridosas” que nos levaram para a loja na tentativa de acalmar o meu desespero, fato que, a ser verdadeiro, foi o primeiro dos meus muitos encontros com as futuras Misses Pernambuco, Brasil e Universo.


Na realidade, foi o desespero da babá que me deixou inseguro. Ah se ela soubesse as consequências daquele dia na minha personalidade futura!

Meia hora mais tarde, no máximo, o que para mim foi uma eternidade, chegou minha mãe em estado pior do que o nosso. Os transeuntes a haviam informado de dois "perdidos" que estavam recolhidos na loja Quatro e Duzentos e ela correu para lá. A "tragédia" terminou com sanduíche de queijo em pão de fôrma sem casca e um "Fratelli" (pernambucano da gema), lá mesmo na Quatro e Duzentos.


Nas idas ao centro do Recife, os lanches eram a melhor parte para mim e, segundo relatos, mal chegava à cidade, eu já perguntava, “A que horas é que vamos lanchar?”.

Uma das minhas maiores excitações era subir a escada rolante da loja Viana Leal e ir lanchar no segundo andar, e nem sei do que eu gostava mais, se da escada rolante, se do lanche.


O salão de chá da Casa Matos não era o meu favorito, porque a espera por uma mesa era longa demais e, mesmo depois de sentados, as senhoras que atendiam não estavam para grande pressa. A única compensação era a de que, devido à demora, o lanche se tornava bem mais saboroso, apesar de ser o mesmo de sempre, sanduíche de queijo (muito raramente, misto com fiambre) em pão de fôrma sem casca e "guaraná Fratelli" (mais tarde, substituído por um "caçula da Antarctica").

Às vezes, o lanche era na Sertã, ao lado do cinema Trianon, mas a mamãe não gostava nem dos lanches nem do ambiente de lá e preferia comer em pé na pequeníssima Casa dos Frios, em frente ao Art Palácio.



Quando era preciso atravessar a ponte da Boa Vista para ir à "Casa do Plissê" ou à "Singer" para continuar as compras na rua da Imperatriz, duas eram as opções, para lanchar, ou se tomava um sorvete na sorveteria Gemba, o que acontecia muito raramente porque eu sempre ficava doente da garganta, ou se ia para a Confeitaria Confiança.


Sinto até hoje o cheiro de bolo xadrez e biscoito quente, que deliciava a todos que se aproximavam da confeitaria. Igualmente na rua da Imperatriz, mas do lado contrário à Confiança, havia uma loja de tecidos com uma pequena e acolhedora casa de lanches ao fundo. Não recordo de mais nada, nem da loja nem do seu local exato, só sei que fui lá algumas vezes.



Mais tarde, em meados da década de 1960, o lanche mudou de endereço e de cardápio e eu, já adolescente, mudei de companhia. Ainda lanchava, às vezes, na Casa Matos, mas o meu maior prazer era ir com os colegas de colégio lanchar na pastelaria Arcádia e “fazer ponto” em frente à mesma. Na realidade, eu gostava bem mais de “fazer ponto” do que de lanchar os famosos jesuítas da Arcádia. Atenção aos conhecedores! O meu "ponto" era feito à porta da pastelaria, e não do outro lado, porque eu não tinha coragem de atravessar a rua e sentar no, hoje tombado, “Quem me quer”!

E os fins de tarde na casa de lanches Estoril ? Como eu achava sofisticado aquele piano, acompanhado pelos periquitos e pela vozearia da juventude bonita de então. Na Estoril, esqueci, a contra-gosto, o sanduíche da infância e passei a pedir um hot dog com uma vaca preta ou um sundae de chocolate e não o clássico, de morango.

Será que ainda há casas de lanche, salões de chá, ou mesmo pastelarias, na rua Nova, na da Imperatriz, ou em qualquer outra daquela área, ou só há lanchonetes?

Será que existe alguma diferença entre aquelas do meu passado e estas do tempo presente? Será que a diferença está apenas nos meus olhos, no meu sentir, no meu não saber conviver com as mudanças? Será?

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

BEOWULF


Não há admirador de literatura inglesa que não conheça e não tenha passado horas debruçado sobre a difícil leitura do épico "Beowulf ", na versão adaptada para o inglês moderno, já que só os especialistas são capazes de ler o texto em inglês antigo.

O meu primeiro contato com "Beowulf" foi no verão de 1975/1976, quando era professor de literatura inglesa em uma faculdade do Recife. Li e reli o poema, além disso, colhi todas as informações literárias a que tive acesso para poder passar algum conhecimento para a turma absolutamente desinteressada em literatura inglesa, principalmente em poemas medievais (com exceção de uma pequena parte das alunas, para ser justo).



"Beowulf" descreve as aventuras de um grande guerreiro escandinavo do século VI. É um poema épico tradicional, compilado entre os anos 700 e 1000 da Era Cristã, escrito em inglês antigo, com o emprego de aliteração (aliteração é uma figura de linguagem que consiste em repetir consoantes, vogais ou sílabas em um verso ou uma frase, principalmente nas sílabas tônicas), com cerca de 3.182 linhas. É mais longo do que qualquer outro poema em inglês antigo - , representando 10% do conjunto da literatura anglo-saxã. O poema não tem um título, à maneira clássica, mas ficou conhecido como "Beowulf "desde o início do século XIX, tendo se tornado um dos mais célebres poemas épicos, um marco na literatura medieval.


O inglês antigo (também conhecido como anglo-saxão) é uma forma primitiva da língua inglesa, falada, entre meados do século V e meados do século XII, em partes da atual Inglaterra e do que hoje é o sul da Escócia. É bastante semelhante ao frísio antigo, ao norueguês antigo e, em decorrência, ao islandês moderno. Indecifrável, para mim.

"Beowulf" existe em um único manuscrito que sobreviveu tanto à destruição de todo o material de cunho religioso (quando da dissolução dos mosteiros por Henrique VIII), quanto ao trágico incêndio que destruiu a biblioteca de Sir Robert Bruce Cotton (que viveu entre 1571 e 1631). As marcas do incêndio são visíveis no canto superior esquerdo, como se percebe na foto obtida do original da British Library, de Londres.

Passaram-se os anos, minha vida mudou, meus hábitos de leitura mudaram e "Beowulf" ficou guardado em um canto obscuro da memória, até que no domingo passado fui assistir ao filme "A lenda de Beowulf". Não sou cinéfilo e muito menos crítico de cinema, simplesmente gosto ou não gosto dos filmes a que assisto e este não se inclui na segunda categoria e, mais não fosse, deixou uma vontade enorme de procurar os meus livros com críticas sobre o épico e reler o poema, que devem estar guardados em algum lugar muito longe de Brasília, onde me encontro.


O filme tem vários méritos, o primeiro é a arte de mesclar a animação (desenho animado) com atores reais, o que transmite um aspecto misto de estranho e de espetacular às cenas épicas - incrível o que a técnica digital é capaz de conseguir! Em segundo lugar, cito as excelentes atuações de Sir Anthony Hopkins e de John Malkovich, que estão sensacionais e Ray Winstone, no papel título, também transmite bem o seu recado, consegue convencer ao assistente, apesar de alguns exageros na interpretação, talvez por se tratar de um filme de animação. Winstone disputando com Angelina Jolie as cenas de nudez discreta do filme. Por último, me agradou o ar de mistério da Alta Idade Média, que nos deixa todo o tempo envolvidos pelo desconhecido, pelo sombrio, pelas fantasias que povoam o nosso imaginário, quando nos remetemos àquele período da história humana.
A direção de Robert Zemeckis tem o mérito de conseguir filmar a aventura em animação e só lamento que em Brasília a exibição não seja em terceira dimensão, para melhor apreciar os excelentes efeitos visuais.
Acessem o link a seguir e vejam mais detalhes: http://www.beowulfmovie.com/
Recomendo.

sábado, 8 de dezembro de 2007

DOS CINEMAS DE BAIRRO E DO GIRAR DO MUNDO


Sábado, para mim, é um dia muito especial e gosto de ficar na cama até mais tarde, mesmo quando já estou acordado. Depois de muito espreguiçar, faço a triagem dos sonhos noturnos e continuo, de olhos bem abertos, a sonhar com aqueles que mais me agradaram. Esta manhã, na cama, a saudade do Cine Coliseu do Recife bateu à porta. Saudade besta, eu sei, pois nem o Coliseu era um primor de sala de espetáculo com direito a sonhos e saudade, nem eu era seu frequentador regular, mesmo assim, sonhei com o Coliseu e senti nostalgia de um tempo distante.




Selecionei o canal do sonho do Coliseu e me deu uma vontade "medonha" de entrar em um ônibus da Amorim, ou na lotação “Marta Rocha”, na parada da Avenida Rosa e Silva em frente à capelinha dos Aflitos, descer na Vila dos Comerciários, atravessar a Estrada do Arraial, ficar na fila, pagar "meia entrada" para assistir a uma chanchada da Cinelândia. Então, depois de adquirir a "meia entrada", compraria jujuba ou dropes dulcora (recém lançados) na salinha que antecede à sala de projeções, passaria para a sala principal, que estaria ainda com as portas laterais abertas, sentaria e, com circunspeção, aguardaria o início do filme. Fui uma criança circunspeta, um adulto anarquista e agora, no alto outono da vida, voltei a ser circunspeto – o mundo gira, gira, gira.
Continuando com o "sonho", fui até capaz de sentir o calor que fazia quando fechavam as portas laterais do Coliseu! Pelo menos, as cadeiras eram de madeira e, mesmo duras, eram bem mais frescas do que as confortáveis, com estofo. Antes de apresentarem os “trailers” dos filmes que seriam exibidos na semana seguinte, sempre passavam as "Actualités Françaises" http://youtube.com/watch?v=Pp6l24UGpK4 e, em seguida, o Jornal da Atlândida: http://hk.youtube.com/watch?v=CRLYBz9dmj8, que, além de publicidade, apresentava notícias da semana ou documentários sobre fatos importantes.
Descobri, recentemente, que a imagem símbolo da Atlândida não tem uma origem muito correta, politicamente falando. Acessem o link a seguir e verão: http://www.youtube.com/watch?v=gzlsUDmTQhs . Não acredito, porém, que esse fato tire o brilho dos seus espetáculos.



Não sei quando o Cine Coliseu (ou seria, “Cinema Coliseu”?) foi inaugurado, mas lembro de que ainda criança era lá que eu ia assistir às comédias da Cinelândia, sempre com Oscarito, Grande Otelo, Zezé Macedo e tantos outros, de saudosa memória e poucas homenagens. Talvez porque eu fosse ainda muito pequeno e os outros filmes, “impróprios” para a idade que eu tinha, é que o Coliseu de minha infância só me traz aos sonhos filmes brasileiros. Na década de 1960, ele transformou-se em "cinema de arte" e voltei lá muitas vezes. Nessa ocasião, eu já ia nos modernos ônibus elétricos!


Quem não lembra de Viridiana, de Zorba, o Grego, de Teorema ? A todos, eu assisti no Coliseu.



No Coliseu não exibiam “séries”, só no Cinema das Graças e esse sim faz parte da aurora da minha infância, pois foi a primeira sala pública na qual assisti a filmes. Lembro bem de que eu gostava da série Flash Gordon. “Série”, para os mais novos, eram seriados que passavam, semanalmente, antes (ou depois) do filme principal e deixavam no espectador uma incontrolável vontade de voltar na semana seguinte. Na realidade, são os antepassados das telenovelas com apenas um capítulo por semana e que, diferentemente destas últimas, obrigavam às pessoas a saírem de casa para acompanhar.

No Cine Graças - salão paroquial da matriz de
mesmo nome - assisti a muitos faroestes - que nunca foram os meus prediletos - e a muitos filmes de ficção científica, o que, pelos vistos, desenvolveu-me essa veia ficcionista.




Depois de mais crescido, comecei a frequentar, a pé e sozinho, o Cine Torre e foi lá que assisti ao filme “13 Cadeiras”, com Oscarito. O Cine Torre, inaugurado em 1942, ocupava uma construção com características do decô tardio e não resistiu mais do que trinta anos como cinema. Não sei se o prédio ainda existe, transformado em mercado, ou se foi demolido.


O Cine Boa Vista também faz parte das memórias remotas, ainda que as minhas idas a ele fossem mais espaçadas do que aos demais cinemas, até hoje não sei bem por qual razão. Acho que a minha irmã tinha alguma cisma com o “Boa Vista” e como todas as cismas dela, depois de curadas, passaram para mim, eu sempre cismei com aquele cinema.


Em determinada fase da vida, fui muito ao Cine Soledade, onde os filmes eram rigorosamente censurados por Monsenhor Sales e, talvez por essa razão, sempre que sonho com o Soledade é com os filmes de Frei José Mojica que eu sonho. O Soledade era o lugar de namorar das meninas do Eucarístico e eram elas o maior atrativo para os adolescentes frequentadores do jardinzinho do cinema. Deixo aqui a pergunta de Reinaldo de Oliveira em uma de suas crônicas :

“Onde andam as saias vermelhas do Colégio Eucarístico?”.


Dentre os muitos cinemas de bairro do Recife existia um que sempre mexeu com as minhas fantasias e, sinceramente, até hoje não me conformo em nunca ter ido lá, o Rivoli de Casa Amarela. E por que eu nunca fui ? Porque o meu pai dizia que o cinema não era bem frequentado, que era perigoso e que não seria bom, para um menino/adolescente tão dado à circunspeção como eu, expor-me a esses perigos. Que frustração em jamais ter descoberto a razão do perigo que me impunham os frequentadores do Rivoli de Casa Amarela!




Nunca fui também, aí por opção, ao Cine Espinheirense que deve até hoje inundar de fantasias os sonhos de alguns (algumas) dos (as) que me lêem. Também não conheci o Cine Encruzilhada, que sei ter existido, mas não exatamente em que local (na Encruzilhada, certamente).


Hoje, não tem mais o Coliseu, o Graças, o Torre, o Boa Vista, o Soledade, o Encruzilhada ou o Espinheirense mas, quem sabe, amanhã não terá tudo de novo?


Neste sábado, então, prefiro ficar quietinho, enroscado nos lençóis e esperar para ver o que acontece, já que o mundo não para de girar e, talvez, no próximo sonho, eu vá ao Rivoli de Casa Amarela!


Fico apenas na vontade "medonha", referida no início desta crônica. Na impossibilidade de poder voltar no tempo, restou-me, nesta manhã, o consolo de que o mundo gira, gira, gira e hoje, em 2007, já compro, de novo, "meia entrada" para todos os espetáculos a que assisto.
Menos mal!