sábado, 10 de novembro de 2007

SURPRESA NO PARQUE HOTEL


(Continuação).Será mesmo verdade ou serão devaneios de uma mente inconformada? Será que não sei onde estou, nem porque estou, nem, principalmente, quando estou? E por que estou agora em uma época na qual já não quero mais estar, em um mundo no qual não gosto de estar? Por que ontem saí deste tempo e fui (ou devo dizer, “voltei”?) para outro, onde tudo me é tão familiar, tão prazeroso? Será que terei sempre de voltar a este ano de 2007, que em nada me agrada? Será que não poderei ficar no passado? Ou o passado seria o presente e o que penso ser o presente, o futuro? Olho pela janela, em busca de respostas e, desilusão! Eis o que vejo:
Não tem mais o meu quarto vinte e sete, não tem mais Parque Hotel, não tem mais Alexandra, mas, para minha surpresa, tem ainda o mesmo piso azul acinzentado que me havia chamado a atenção naquela tarde de julho de 1932. Sento-me no chão, sem forças para continuar vendo o mundo lá fora e fixo o olhar em um dos mosaicos.

Olhei, olhei, olhei e ... senti que alguém me chamava com insistência - “¿Señor, lo que se pasa? ¿Por qué está sentado ahí hace más de diez minutos? ¿Desea que yo llame un medico?” – Levantei-me assustado e dei de caras com o estafeta, que também fazia as vezes de recepcionista e que me havia dado o bilhete com os nomes dos ocupantes do quarto vinte e cinco.
Tal qual um louco, sem nem mesmo esperar o elevador, desci as escadas do Parque Hotel, corri para a praia e ... tudo estava exatamente como meia hora antes, a única diferença era que as primeiras estrelas já começavam aparecendo.

Abracei o estafeta, que também havia saído do hotel correndo
comigo e ele, sem nada entender, mas sempre querendo ajudar, enfiou outro pedaço de papel no meu bolso. Pedindo infinitas desculpas, disse ter feito uma enorme confusão ao escrever de memória os nomes que eu havia solicitado. Nervoso, acrescentou que em uma república como a Oriental do Uruguai as pessoas não entendiam muito de títulos de nobreza, mas que graças a uma camareira com quem ele compartilhara o meu pedido, a qual, além de monárquica das antigas, era brasileira como eu, o engano havia sido corrigido.
Aí, então, era eu quem não entendia nada do que ele dizia, ainda mal refeito estava do susto de pensar que tinha, de novo, "voltado" para uma época futura, mesmo assim, apanhei o papel da algibeira. Outro bilhete, que li debaixo de um poste:
"Alexandra Mary of Leicester, condessa viúva de Leicester e Timothy Edwards of Leicester, conde de Leicester".


Não dei muita atenção à confusão do rapaz, nem à mudança de título, mas preocupei-me com a camareira que, gostando ou não, agora fazia parte dos meus segredos. Precisaria saber mais detalhes sobre quem era e a razão de estar aqui em Montevidéu.


Recomposto, voltei ao hotel e pareceu ouvir alguém lá fora chamando – “Timothy, Timothy”. Olhei para trás e para os lados, mas o lobby estava vazio, só os responsáveis pela grande gala da noite é que trabalhavam nos preparativos. Do lado de fora também não vi ninguém, embora tivesse tido a sensação de que dois vultos passeavam pela areia lá em baixo.


Entrei mais uma vez no elevador, o ascensorista já estava correndo a porta pantográfica quando o estafeta - recepcionista nas horas de folga do efetivo - fez um sinal para esperar um pouco. Senti um maravilhoso perfume Chanel no ar e, para meu encantamento, quem adentrou o elevador? .Ela, mais enigmática do que nunca, Alexandra, que agora, graças à camareira ainda desconhecida, sabia ser condessa e não duquesa.
Um leve sinal de cabeça, como da outra vez, um cumprimento idêntico de minha parte, desta vez já com o chapéu na mão. O elevador inundou-se de Chanel e do verde dos olhos dela.O ascensorista fechou a porta pantográfica e o elevador comecou lentamente a subida.

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